O mar dentro dos sonhos
Sei bem quem fico,
Por certo oposta
No qual me perco
Onde se nota,
Nesse riacho,
Que esta sou eu...
Talvez, quem sabe?
Quando o vento fica lufando, por vários dias,
sobre o rio, é sinal de que suas tiorgas vão mudar o
seu curso... Elas vão desembocar no mar, por outro
trajeto...
Contudo, ele tem horror ao vazio, então, procura contornar as pedras, que, pelo caminho, estão,
e, ao passar, consegue seguir o mesmo percurso,
que sempre fez, até que suas águas cheguem ao mar
e se tornem salgadas... O que deveria brotar, naquele momento, deveria ser eu mesma... Estar, ali,
naquela hora e poder assistir ao entrosamento do
rio com o mar...
Mirando aquele oceano, o meu céu estava vazio,
eu não era uma pedra e, portanto, o sol podia me esquentar... Mas, o que resultava desse aquecimento
do sol, parecia-me ser um circuito elétrico. As minhas
veias, os meus nervos eram a fiação, através da qual
a eletricidade corria veloz, soltando faíscas... Nada
parecia interessar-me... Mas, era, apenas, um sonho,
para que eu pudesse recordar o passado...
Oh...lugar lindo, para que eu pudesse rememorar, onde ele me mostrava, deslumbrantemente, etapas de minha vida... Passagens maravilhosas, que, um
dia, eu tive a doce alegria de palmilhar... Vontade de
correr atrás, insistir... Pedir uma explicação... Mas, pedir a quem, ao sonho?
Não é sempre que temos a oportunidade de que
os devaneios sejam repassáveis, ainda que, dentro deles, seja como se o passado estivesse em construção
e o futuro prometendo ser lindo, tal qual a onda do
mar, que ele traz até a praia e nos encanta, com suas
espumas bem brancas, a nos deslumbrar...
Talvez, coisas que não servem para nada sejam
as mais importantes... Até as sonhadas expressavam
nosso temperamento vital, cheio de alento, incapaz
de enxergar as sombras... Seriam elas, também, duvidas, esfaceladas, quebradas em mil pedaços, até
serem forçadas, algum dia, a recolher os fragmetos e a tentar recompor as sobras... Pois, pessoas só
ficariam inteiras, quando aprendessem a vencer as
sombras...
Em certas épocas da nossa vida, dentro de nossas noites, passeamos pelas mais lindas praias, que,
antes, não conhecíamos, somente os nossos sonhares nos mostraram...
23Corre como um rio
A cor do mar, em tom sobre tom, vai do verde esmeralda ao verde água clarinho, e a temperatura
da água, como imaginamos, é morna e o vento está,
sempre, soprando a nosso favor, levando-nos a passeios, de barco, até os lugares mais lindos do nosso
passado, que, em nossa memória, ficou...
Nesse mar, quando a maré desce, é a hora em
que podemos mergulhar, para que possamos avistar,
lá no fundo, épocas, que já passaram e enxergaremos
peixes de todas as cores e desenhos... A água desse
pélago é tão transparente, que dá para ver, claramente, todos os mergulhos, que já oferecemos, até aqui,
no presente...
Mas, quando a maré se tornou encapelada, eu
sabia bem quem eu era, ilógica, no qual me perdia
e, ali, me encontrava comigo mesma, nesse violento oceano e tinha a certeza de que aquela era eu...
Quem sabe?
E tem muito mais beleza, na imensidão desse
golfo e, o que é mais belo é o sol, o tempo todo refletindo em suas águas... Poderei ter a certeza, sem
dúvida alguma, de que, dentro dessa enseada, que,
em meus sonhos, aparece, existe o paraíso, que é, ali,
dentro dos devaneios...
Então, naquela noite, dentro de meus sonhos,
sentindo o cheiro do lagamar, que trazia suas ondas,
com as espumas brancas e perfumadas, ví, em seu recôncavo, calmo, tranquilo, sereno, como sempre foi,
em meu sono...
Ouvindo o barulho das ondas, a bater nas rochas, como a pureza de um cristal, contrastando com
24Marilina Baccarat de Almeida Leão
o timbre da minha voz, achei que havia encontrado
o meu porto seguro... Uma base, que, com alicerces
seguros, daria novo alento à minha vida, dentro desse
riacho, que é um imenso oceano, onde me acho...
O passado foi bom e é afável recordá-lo, principalmente, quando estou dentro dos sonhos, apreciando a calmaria do imenso mar. Isso é maravilhoso,
pois são poucos que têm o privilégio de sonhar com
o aguapé e tudo que há nele...
Observava um garoto a jogar uma bola para o
seu cão, uma criança seguia de mãos dadas com seus
pais, que a erguiam de vez em quando para fazê-la
voar, e suas risadas confundiam-se com o rumorejar
das ondas, que o mar, generosamente, as jogava de
encontro às pedras...
À noite, chovera, abundantemente, o ar estava
frio e nuvens carregadas e escuras corriam ao longe do horizonte... Na praia do meu sonho não havia
ninguém, naquela noite...
Enquanto caminhava, nas areias brancas do
mar, segui em silêncio e consegui reviver o passado, onde, no mar, me achei, dentro dos meus
sonhos...
Marilina Leão no livro "Enquanto Espero o Sol"